quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

O Estado


{Agradeço ao R, pois ele sem querer acabou me inspirando a escrever este texto. Nada do que escrevi aqui é revolucionário ou inédito, mas sim baseado no conhecimento que adquiri com diferentes pessoas, principalmente ao longo do ano passado}

Era uma vez uma entidade abstrata e onipotente chamada Estado. De vez em sempre, o Estado adorava sacanear as pessoas, aprontando uma de suas brincadeiras irônicas. Esqueci de dizer que além de abstrato e onipotente, o Estado também é irônico.

Um exemplo de como o Estado adora ironias e contradições, é exemplificado a seguir. Se eu, cidadão brasileiro, atropelar vários pedestres e ciclistas, bater em outros carros e fizer várias barbeiragens após ingerir álcool, provavelmente serei autuado em fragrante e preso, indiciado por homicídio doloso. Porém, se o mesmo evento acontecer com Thor Batista, filho do bilionário Eike Batista, o que acontece é que ele é conduzido gentilmente até a delegacia, solto pouco tempo depois após pagar uma fiança que, para o padrão de vida dele, sequer faz cócegas em seus bolsos. E de quebra, pra fechar com chave de ouro, se o motorista fosse o Thor Batista, nesse caso o coitado do ciclista seria preso por tentativa de homicídio ao playboy, e isso apenas porque teve a infelicidade de ter nascido preto e pobre.

Ah, isto me faz lembrar que é importante frisar que tem três categorias que são as que mais se ferram no Brasil, conhecidas por 3Ps: pretos, pobres e prostitutas. O Estado adora ferrar apenas os já naturalmente ferrados pela vida, mas ajuda os verdadeiros ruins da história toda a darem-se bem. O Estado criou algo chamado bem e mal. O bem é representado pelos ricos, pelos brancos e membros de uma família “estruturada”, que ganharam dinheiro e construíram seus patrimônios de maneira digna¹ e honesta¹, sem explorar sequer uma alma viva (até porque os 3Ps não têm alma), sem cometer nenhuma injustiça ou atitude condenável. Pelo menos, nenhuma atitude condenável à luz da Constituição. Constituição. Tá aí o instrumento utilizado pelo Estado para brincar com as pessoas, empoderando uma minoria que já detém o poder e lascando de vez os já lascados.

Só que o Estado, com essas brincadeirinhas que ele julga bobas, muitas vezes acaba pegando pesado demais. Vamos dar um exemplo sobre isso, utilizando a Constituição como base. Uma negrinha pobre, de uma favela, tem um filho com um drogado. Esse filho, obviamente também negro, nasce num lar pobre e desestruturado. E o Estado brinca de faz de conta com aquela família, pois no seu livro predileto, a Constituição, ele diz que é direito de toda pessoa a educação, a saúde, a alimentação, a moradia, o emprego, a dignidade e a muitas outras coisas importantíssimas para todos. Mas lembre-se que é apenas um faz-de-conta. Porém, outra parte deste livro, é baseado em fatos reais. E é a parte que diz que roubar, traficar, assaltar, é crime.

Em outras palavras, como muito bem disse o R numa conversa que tive com ele dias atrás, o Estado não faz nada para cumprir a parte que lhe compete, neste conto da carochinha que ele mesmo criou, aí quando o garoto da nossa história tenta dar um jeito de se virar e sobreviver – dar um jeito com base nas poucas opções que lhe foram dadas – o Estado resolve dizer que parte da fantasia era realidade, e o pune severamente. E nós, pobres e tolos brasileiros, acreditamos. Acreditamos que a favela é uma fábrica do mal. Que o negro é o perigoso. Que ele é só culpado, jamais vítima.

O Estado às vezes é muito cruel em sua arte, permitindo Carlinhos Cachoeira, um dos grandes corruptos do momento, curtir lua de mel, livre e solto, mesmo após inúmeras acusações contra ele. Permite ainda que José Genoíno – aquele tiozinho vagabundo do PT e do mensalão – assuma uma cadeira no Congresso Nacional, mesmo com a Lei Ficha Limpa. Mas não dá segunda chance para o ex-presidiário. Aliás, não dá nem uma primeira chance, na vida pregressa a contravenção que levou o indivíduo, quase sempre preto e pobre, a ser preso.

Por fim, mais uma brincadeira que o Estado faz conosco, e talvez uma fundamental para que todas as outras funcionem, é brincar de cabra-cega. Ou melhor, povo-cego. Todo mundo fica cego, ninguém percebe o que está acontecendo, como essa máquina chamada Estado funciona. E os poucos que percebem, são praticamente impotentes frente a uma multidão que apóia (cegamente) o Estado.

E a quem culpar? A presidência? Aos deputados e senadores? Ao aparelho jurídico? Ao povo? Talvez, após ter lido este texto, alguém pense “culpemos o próprio Estado”. Advirto que o Estado, como eu bem disse no início do texto, é uma entidade abstrata e não é passível de ser punido. Só espero que eu esteja errado em uma coisa: quando eu disse que o Estado é onipotente.



Carlinhos Cachoeira pagando por seus pecados.



José Genoíno mandando seu recado para o povo.



Quimby, o prefeito de Springfield é um exemplo de bom governo e honestidade.



Já o Prefeito, que é prefeito de Townsville, está sempre ao lado de sua secretária de grandes seios,
a Senhorita Belo. Escândalos sexuais são comuns no mundo político.


E é por esse e por outros motivos que eu sou comunista.



¹ Caso a ironia não tenha ficado clara neste trecho, eu ratifico aqui que fui irônico.